quarta-feira, abril 04, 2007

Cinecrônica: "300", de Zack Snyder


Sabe, tem uma coisa que sempre tenho em mente quando vou me sentar em alguma sala de cinema: se eu estou gastando meu dinheiro pra estar alí, é porque quero que o filme me satisfaça de alguma forma, seja no visual, seja na história, seja nas atuações. Nem sempre essas três coisas se encontram em uma sessão apenas, de repente acontece de ver um filme onde as atuações são excepcionais mas a execução deixa a desejar; ou o filme é visualmente belo e a direção é ótima, mas a história não ajuda; ou quando o filme tem um roteiro excelente, mas equipe técnica e atores tratam de estragar aquilo que poderia dar um bom filme. Tendo isso em mente, gastei os meus últimos trocados do mês num filme que andou dando o que falar: "300", adaptação dos quadrinhos do mestre Frank Miller para a tela grande.

O que senti ao ver o filme dirigido por Zack Snyder é que ele trouxe de volta uma coisa que eu não via desde "Gladiador" - aquele com o Russel Crowe e dirigido pelo Ridley Scott - que é a dignidade na morte. Todos os personagens espartanos, todos os trezentos soldados têm o mesmo discurso: eles sabem que não vão voltar pra casa. E acham isso uma maravilha. Mais ou menos como os pistoleiros do clássico do faroeste "Era Uma Vez no Oeste". É uma coisa rara e que resgata um tipo de filme muito esquecido ultimamente, o filme de herói kamikaze.
O filme é excepcional desde sua concepção visual: é tudo tão idêntico aos quadrinhos do Frank Miller que é de ficar boquiaberto. É espantoso como a equipe de artes de "300" conseguiu transpor a atmosfera 'nerd' sanguinária dos quadrinhos para o cinema, até as seqüências de batalha remetem às páginas. Tem um início arrebatador, quando explica como são criadas as crianças em Esparta, na Grécia Antiga, e acompanhamos como Leônidas (Gerard Butler, no papel que o tornará conhecido pelo resto de sua carreira, provavelmente) passou pelos duros testes até se tornar Rei de Esparta. A coisa toda começa a pesar quando um mensageiro do Deus-Rei Xerxes (Rodrigo Santoro, numa atuação que dá pro gasto) aparece para fazer uma proposta ao povo espartano, no que recebe a recusa do Rei Leônidas [com uma frase que entra pro hall de frases marcantes do cinema: "This is Spartan!!"] e declara guerra a Xerxes, contra a vontade dos conselheiros do local. Então, ele escolhe os trezentos melhores guerreiros de Esparta e marcha contra as tropas - milhares delas - do egocêntrico Deus-Rei. O resultado disso é uma batalha sangrenta e inesperada.
Com sua trama surpreendente, atuações que oscilam entre excelentes (Gerard Butler, David Wenham [que interpretou um dos trezentos soldados espartanos e tem papel significativo]) e medianos (Lena Headley como a Rainha Gorgo, Rodrigo Santoro como Xerxes), fica bem mais fácil tornar o filme um sucesso, como realmente foi. Mas com um diretor habilidoso e esteta como Snyder, o filme não sobe um degrau, se eleva com escada rolante. Os efeitos, a arte conceitual do filme é soberba e deixa qualquer um de queixo caído, como poucas vezes aconteceu comigo, por exemplo, ao ver um filme na telona. Não tenho dúvidas de que tanto o filme como seus realizadores entrarão pra lista A de Hollywood. E Frank Miller será cada vez mais colocado nas telas do cinema. Agradeçam a Robert Rodriguez e seu "Sin City", outro filme maravilhoso.
"300" fez os espectadores do mundo todo ficassem fascinados pelo cinema de novo. Numa época em que o nacionalismo exarcebado dos norte-americanos se reflete em tudo, fazendo com que para nós a trama toda seja estragada por lições belicistas, ou se preferir, num cinema quase todo sem criatividade - exceto os filmes independentes, cada vez melhores - o filme de Snyder nos traz de novo a mesma sensação que aqueles que viram "E.T" na época de seu lançamento sentiram: aquela emoção de verem uma história bem contada, emocionante como poucas. Logicamente, com muito mais violência e sangue. Mas, quem liga a TV diariamente na hora do jornal, certamente vê coisas piores. Pelo menos, "300" nos entretém dignamente. Estamos, senhoras e senhores, diante de um dos filmes do ano. E possivelmente, de um dos filmes da década.
Nota:
********** (10/10)

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